domingo, quase sempre, é dia de jejum pra mim.
não para compensar qualquer “jaca”, e muito menos como tentativa desesperada de emagrecer. Faço jejum por muitos outros motivos e objetivos, e é isso que vou te contar hoje.
pode ser que você tenha já torcido o nariz e achado estranho. para muitos isso é estranho, às vezes até loucura, mas para outros é curioso e interessante. confesso que torci o nariz das primeiras vezes, e pode ser que você esteja fazendo o mesmo agora, mas continue lendo esse texto que tenho certeza que você vai chegar ao final, no mínimo, curiosa.
já recebi muitas mensagens sobre o assunto, pessoas querendo saber porque e como sou adepta do jejum, e como acredito que essa prática pode ser muito benéfica para a maioria das pessoas, resolvi compartilhar aqui um pouco da minha experiência e o que estudei e aprendi sobre o assunto, nada mais.
não quero aqui te convencer de nada, apenas compartilhar algo que vem dando muito certo para mim (em questão de saúde, performance e estética), e que pode ser um bom caminho para você também. ou não.
jejuar, privar-se de alimentos, é uma prática que permite ao organismo reciclar nutrientes, organizar sua estrutura biológica e metabólica, fortalecer a imunidade, produzir hormônios em deficiência, eliminar componentes desnecessários, potencializar e desempenho físico e mental…
é, a lista é grande e pode parecer bom demais para ser verdade, mas basta olhar para nossos primitivos, para grandes mentes da história e para os animais que você vai perceber tudo isso se provando real e efetivo.
o jejum é uma função biológica, é o estado natural do corpo funcionar. nós é que mudamos o padrão e inventamos práticas contra produtivas e conta intuitivas de lidar com nossa biologia. mas vale destacar que esta abordagem é indicada para adultos saudáveis, e deve ser considerada com muita cautela e orientação médica, especialmente por diabéticos.
o jejum é especialmente fácil para quem já se alimenta de forma natural, tendo gordura e não carboidratos como a base da alimentação. não intencionalmente, foi assim que comecei…
há quase dois anos aderi à dieta low carb-high fat. me encucava demais o fato de todo dia a tarde sentir uma forte queda de energia, sono, preguiça, improdutividade. foi tentando solucionar isso que eu o gabriel chegamos a um novo contexto de alimentação, quase que exatamente o oposto ao que fazíamos até então (comer de 3 em 3 horas, pesar comida, restringir ao máximo as gorduras e comer muito, sobretudo proteína.).
a parte de poder comer bem pouco carboidrato e muito mais gordura (boa) do que eu estava acostumada fez meus olhos brilharem desde o começo. eu tinha um certo trauma de que nada com gordura podia.
quando pequena eu vivia de dieta por conta do ballet e lá em casa tudo era comprado duplicado. a geladeira era praticamente meio a meio, meu irmão comia os ingredientes integrais e eu, os light e desnatados.
foi assim até pouco tempo atrás, um fiozinho de azeite na salada e eu pedindo nos restaurantes para me prepararem tudo sem azeite, manteiga…
felizmente, eu descobri esse novo jeito de me nutrir e hoje como as coisas inteiras, o mais natural possível, e se tem uma coisa que faz (muito) parte da minha alimentação são gorduras boas: manteiga, coco, abacate, óleo (e de vez em quando um queijo bem gordo, tipo parmesão).
adaptada a nova “dieta”, que eu mais considero um estilo de vida, dei o próximo passo, testar o jejum. o gabriel saiu uma semana na frente, e logo em seguida eu fui, alinhando os testes a estudos.
o primeiro livro que li sobre o assunto foi o eat stop eat, de brad pilon. recomendo a leitura como uma das principais fontes de estudos e evidências que confirmam a eficiência e naturalidade do jejum como uma função biológica, mas também como uma oportunidade de talvez se libertar de muitos (falsos) paradigmas que talvez hoje você tenha como verdade.
eu pratico hoje dois protocolos diferentes: diariamente, faço jejum intermitente, e sempre que possível faço, uma vez por semana, um jejum mais longo de 24 a 36 horas.
quero deixar aqui quais são os meus motivos para, depois de quase dois anos, continuar praticando jejuns e gostando cada vez mais disso. quem sabe não faz sentido para você e decide fazer um teste também…
1 – queima mais gordura
a glicose e a gordura são as principais fontes de energia do corpo. quando a glicose não está disponível o corpo se adapta e passa a usar a gordura como fonte de energia, sem quaisquer prejuízo à saúde. é natural.
o corpo armazena glicose sob a forma de glicogênio e quando estas reservas se esgotam o fígado começa a queimar gordura para produzir energia. ou seja, o armazenamento de curto prazo é feito sob a forma de glicose e o de longo prazo, sob a forma de gordura.
assim sendo, diferentemente de uma dieta de baixa ingestão de calorias, o que o jejum proporciona é que o corpo mude seu padrão de funcionamento e comece a queimar gordura, usando suas reservas como fonte de energia.
durante o jejum, a produção de insulina diminui e a sensibilidade à insulina aumenta, e de forma bem simplificada, quanto mais sensível à insulina for o nosso corpo, mais eficiente será a queima de gordura.
a insulina é naturalmente reduzida com low carb, mas nunca fica tão baixa quanto em jejum. Por isso, quando falamos em jejum intermitente estamos falando em otimizar o funcionamento padrão do corpo: a sensibilidade à insulina que está alta após 6-8h de jejum (durante o período de sono) é potencializada pela prática do jejum intermitente, estendendo o período de não ingestão de alimentos e dando continuidade ao aumento dessa sensibilidade por mais algumas horas.
assim, estando o corpo mais sensível à insulina, quando voltamos a nos alimentar (no refeeding) o alimento é metabolizado de forma mais satisfatória.
resultado: através do jejum intermitente reeducamos o corpo a utilizar o alimento da maneira mais efetiva possível, sem gerar acúmulo de gordura ??.
2 – regula a produção de diversos hormônios
o jejum não só reduz a ingestão de calorias como promove inúmeras adaptações hormonais altamente benéfico ao corpo.
além de diminuir a produção de insulina, ele também atua sobre o hormônio do crescimento (GH), conhecido por aumentar a disponibilidade e utilidade de gorduras como combustível, além de ajudar a preservar a massa muscular e densidade óssea. A secreção do GH diminui progressivamente com a idade e um dos estímulos mais potentes para a sua secreção é o jejum.
Aumentando a secreção de GH e a sensibilidade à insulina, a gente queima mais gordura (como citado em 1) e ganha massa magra (como vou te contar em 3).
Os níveis de adrenalina também sobem consideravelmente, o que provavelmente acontece para que tenhamos energia para ir em busca de alimentos e para enfrentar os desafios.
Só coisa boa, essa é a conclusão.
3 – não compromete o ganho de massa magra
inúmeros estudos comprovam que não há risco de perder massa magra com o jejum intermitente (e no eat stop eat tem diversos estudos e evidências).
todos os tipos de exercício são incentivados, e o jejum intermitente pode ser, inclusive, considerado uma ótima estratégia para ganho de massa magra, especialmente quando alinhado a pratica de exercícios de resistência.
há um equívoco comum de que comer é necessário para fornecer “energia” para o corpo funcionar, mas biologicamente isso não é verdade, é mais um padrão mental que internalizamos.
o fígado fornece energia via gliconeogênese, mas durante os períodos mais longo de jejum, os músculos são capazes de usar ácidos graxos diretamente como fonte de energia. como seus níveis de adrenalina estarão também elevados, o jejum pode ser o momento ideal para se exercitar, resultado disso também o aumento do hormônio do crescimento e o crescimento muscular.
é, pode parecer bem estranho, afinal estamos acostumados a ouvir é exatamente o oposto, né?!
achei tão estranho isso que ano passado mesmo eu tirei a prova… passei mais de um mês fazendo aulas de ballet (que acredite, são bem intensas) em jejum, e funcionou para mim: nunca senti fraqueza e percebi sim uma diferença na tonificação dos membros inferiores.
4 – não desacelera o metabolismo
esse é o argumento mais comum que sustenta a teoria que devemos comer de 3 em 3 horas. mas o metabolismo não desacelera com o jejum, ele pode inclusive acelerar.
é só parar para analisar e você vai perceber quão desvantajoso seria para a sobrevivência da espécie humana se isso fosse verdadeiro…
imagina se o estado de jejum fosse lentificando o metabolismo e nos deixando cada vez mais fracos. teríamos cada vez menos energia para caçar ou coletar alimentos e chegaríamos a um ciclo vicioso ao qual a espécie humana nem teria sobrevivido.
é muito diferente fazer uma dieta com ingestão de baixa caloria e não se alimentar (é importante estar presente para isso), e muito provavelmente vem daí a errônea ideia de que o jejum desacelera o metabolismo e, ainda, que pode ser uma prática perigosa.
no primeiro caso o corpo diminui sua atividade para preservar o gasto total de energia. no entanto, se nem temos alimento para usar como fonte de energia o corpo não para, ele começa a usar a gordura armazenada como fonte de energia. é justamente por isso que ela está aí, não só para enfeitar 🙂
Estudos comprovam que efeito do jejum pode ser até contrário, a aceleração do metabolismo, assim como também pode aumentar o gasto de energia de repouso.
5 – é bom para o cérebro
assim como a prática de exercícios físicos, o jejum também aumenta a produção de proteínas no cérebro que são chamadas de fatores neurotróficos, os quais promovem o crescimento dos neurônios e fortalecem suas sinapses.
então, além de permitir que o cérebro se nutra do seu alimento ideal, os corpos cetônicos, o jejum intermitente tem a incrível capacidade de reparar neurônios danificados e estimular a geração de novos neurônios (neurogênese).
meu momento mais criativo e no qual sinto que meu cérebro está no seu estado óptimo é, não a toa, no período da manhã, antes de fazer minha primeira refeição e quebrar o estado de jejum. Por isso eu sempre reservo as manhãs para fazer atividades mentais, e sem dúvidas sinto que performa melhor assim.
às vezes tomo café com óleo de coco e manteiga, que por ser apenas uma mistura de café com gordura não provoca pico de insulina e, portanto, não tira o corpo do estado de jejum. É um boost a mais de gordura e poder mental 🙂
sim, o fortalecimento das sinapses e toda ação hormonal que o jejum gera no corpo beneficiam também nosso desempenho mental. Mas nada melhor do que testar e provar por si mesmo esses benefícios!
6 – é muito mais produtivo
esse foi, se dúvida, um dos motivos que mais me atraiu no início.
cheguei num momento em que achava chato e tinha até preguiça de me alimentar, pois tinha a sensação que toda hora era hora de comer e eu não conseguia fazer mais nada. fazia uma refeição e quando entrava no flow do trabalho tinha que parar, já era hora de comer de novo. boring!
eu andava com lanchinhos na bolsa e vivia cheia de neuras, pois meus médicos na época diziam que se eu não comesse de 3 em 3 horas estaria engordado. ?
ou seja, vivia em função da comida e isso começou a me incomodar demais pois começou a atrapalhar meu desempenho no trabalho, a interromper e frustar meus momentos de foco e máxima produtividade.
nos primeiros dias que testei o jejum intermitente já vi a liberdade batendo na minha porta. passei a ter a maior parte do dia para fazer coisas realmente produtivas, que me engajavam e traziam resultado, e aí dedicava normalmente apenas dois momentos para me alimentar, com tranquilidade e prazer. nossa, outra vida!
a verdade (bem intuitiva) é que quanto menos você come, menos tempo precisa para comer. e quanto menor a frequência com que come, menos tempo gasta preparando o que vai comer 🙂
então esse é, sem dúvidas, um dos maiores benefícios do jejum intermitente: a produtividade. assumir o controle sobre seu tempo e sua energia e usá-los da melhor forma possível, seja para estudar e trabalhar, seja para aproveitar sua intuição que fica mais aflorada, ou ainda para aproveitar sua maior sensibilidade e olhar para dentro, acalmar os pensamentos e meditar.
7 – faz a gente viver mais e melhor
“quanto menos se come, mais se vive”.
isso a sabedoria ancestral já nos conta há muito tempo, mas é também claramente percebido em qualquer organismo vivo. comer mais do que o necessário envelhece prematuramente.
quando o corpo está sem seu combustível usual, o glicogênio, ele passa não só a queimar gordura, mas também a reciclar componentes celulares danificados, processo chamado de autólise (lembro tanto das figurinhas ilustrando isso na escola, rs). é uma espécie de autodigestão, um processo que permite ao corpo se recuperar mais rápido e ter a capacidade de renovar os seus sistemas, como o sistema imunológico.
por isso que é comum os animais pararem de comer quando estão doentes. isso é estratégia, poupar a energia do processo de digestão e canalizá-la para encontrar recursos que os ajudem a se recuperar mais rápido. a gente também costuma perder o apetite quando fica doente, mas normalmente, em vez de ouvirmos o corpo pedindo por um jejum, escutamos as pessoas dizendo “precisa comer bastante, agora não pode faltar nutrientes”. falta de autopercepção!
o corpo é uma máquina como outra qualquer, então quanto mais combustível a gente coloca nele e o faz trabalhar, mais ele vai se depreciando.
são esses os motivos pelo quais eu pratico jejum intermitente todos os dias (18h de jejum e uma janela de 6h para me alimentar) já há quase dois anos e tento também fazer um dia de jejum mais longo por semana (24-36h), como sugere o livro que tenho como maior referência sobre o assunto, eat Stop eat.
diferentemente do que muita gente pensa, o principal objetivo de quem faz jejum não é a baixa ingestão de calorias e, portanto, o emagrecimento. o objetivo maior são as mudanças hormonais benéficas que ocorrem durante o jejum, totalmente impedidas pela ingestão constante de alimentos, e a partir disso uma saúde melhor e um estilo de vida muito mais produtivo e eficiente.
todas as adaptações benéficas que o corpo faz para o jejum não são possíveis de acontecer em uma dieta de baixa caloria, por isso, ainda que a ingestão muitas vezes acabe sendo inferior a quem se alimenta 5-6 vezes por dia, esse não é o fator central. o jejum intermitente deve estar atrelado a uma dieta natural e rica em gordura, portanto, mais calórica.
se você busca ter alta performance no seu dia a dia, sem dúvida deve fazer um teste e ver como seu corpo reage ao jejum intermitente.
para a maioria das pessoas o caminho mais fácil é deixar de tomar o café da manhã e começar a alimentação do dia pelo almoço.
sempre amei café da manhã e achei que seria difícil. gostava do ritual e da ideia de começar o dia como uma rainha, afinal sempre ouvi que essa era a principal refeição do dia, que deveria “comer como rainha e jantar como plebeia”.
como esse era meu padrão, eu acordava já com fome, barriga roncando. mas a verdade é que o nosso corpo é viciado e mal acostumado. a gente come muito mais do que precisa e o ensina a hora em que deve manifestar sintomas de fome ou não.
enfim, tirei de letra desde o primeiro dia. optei por pular o café da manhã e manter o jantar. então, normalmente, eu almoço às 12h/14h e faço minha última refeição às 18h/20h.
o jejum de 24h ou 36h eu costumo fazer aos domingos, mas não é uma regra, apenas respeito o que meu corpo pede. mas sempre aproveito para fazer quando viajo de avião. junto o foco proporcionado pelo jejum e a impossibilidade de distrações no avião para trabalhar, estudar, escrever. é sempre muito produtivo, e de brinde ainda me salvo de comer comidas bem pouco saudáveis, tanto no vôo quanto no aeroporto. fica como ideia para você também, recomendo muito! 😉
caso queria se aprofundar no assunto, o livro já está mais do que recomendado. mas aqui tem também uma entrevista interessante com o Brad Pilon, e um FAQ bem completo que achei esclarecendo dúvidas sobre jejum intermitente.
compartilhei como e porque eu virei adepta do jejum e adoraria saber de você o que achou do assunto. já testou? se animou? te vejo aqui nos comentários 🙂